Waimiri Atroari

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Defensor dos Waimiri Atroari
Idealizador e criador do Programa Waimiri Atroari 

José Porfirio Fotenele de Carvalho

(1946-2017) em memória

José Porfírio de Carvalho: Indigenista, Visionário e Defensor Incansável dos Waimiri Atroari

        Nascido em 24 de dezembro de 1946, em Granja, no Ceará, José Porfírio de Carvalho tornou-se uma das figuras mais respeitadas, corajosas e humanistas da história da política indigenista brasileira. Ao longo de quase cinco décadas de atuação, construiu uma trajetória marcada pela ética, sensibilidade e defesa intransigente dos povos originários da Amazônia — em especial dos Waimiri Atroari, cuja história de resistência se entrelaça profundamente com a sua própria vida.

Formação Indigenista e Atuação na Funai

        Porfírio ingressou na Fundação Nacional do Índio (Funai) em 1967, logo após a extinção do Serviço de Proteção aos Índios (SPI). Desde o início, destacou-se por sua postura íntegra e seu olhar atento às realidades culturais e espirituais dos povos indígenas. Tornou-se especialista em etnologia e passou a ser reconhecido por diferentes comunidades pelo seu trabalho dedicado em áreas como saúde, educação e proteção territorial.

Anos de Repressão: Coragem em Tempos de Ditadura

        Durante a década de 1970, em plena ditadura militar, Porfírio participou das ações de contato com os Waimiri Atroari, num contexto marcado pela violenta construção da rodovia BR-174, que atravessou o território indígena sem consentimento e trouxe destruição, doenças e morte. Centenas de Waimiri Atroari foram dizimados, e seu modo de vida quase desapareceu.
Mesmo sob forte repressão, Porfírio teve a coragem de denunciar publicamente os massacres, o uso de explosivos e as graves violações de direitos humanos cometidas contra o povo Kinja (como os Waimiri Atroari se autodenominam).
Por sua postura firme, foi processado com base na Lei de Segurança Nacional, transferido compulsoriamente e, mais tarde, exonerado da Funai — em clara retaliação por sua coragem e compromisso ético. Ainda assim, seguiu atuando, fundando a Sociedade Brasileira de Indigenistas, que simbolizava a resistência de servidores públicos comprometidos com a verdade.

O Retorno e o Programa Waimiri Atroari

        Com a abertura política e o fim do regime militar, Porfírio foi reconvocado em 1988 para coordenar o recém-criado Programa Waimiri Atroari (PWA), uma iniciativa concebida como forma de reparação pelos impactos devastadores da Usina Hidrelétrica de Balbina e da própria BR-174.
Sob sua liderança, o programa tornou-se um modelo de gestão participativa e intercultural, referência nacional e internacional na relação entre Estado e povos indígenas. Entre as ações implementadas destacam-se:

  • Criação de escolas bilíngues e produção de material didático próprio;

  • Atendimento médico integral e formação de agentes de saúde indígenas;

  • Projetos sustentáveis de piscicultura e agricultura;

  • Vigilância territorial e ambiental conduzida pelos próprios Waimiri Atroari;

  • Instalação de barreiras noturnas na BR-174 para proteger as aldeias dos impactos do trânsito.

Um Povo em Crescimento e Reconstrução

        Os resultados do PWA são expressivos. Em 1987, existiam apenas 374 Waimiri Atroari. Em 2025, são 2.738 Kinjas distribuídos em 91 aldeias, um crescimento que simboliza a força, a recuperação e a continuidade de um povo que resistiu ao extermínio e hoje reafirma sua cultura e autonomia.

Um Legado de Resistência e Dignidade

        José Porfírio de Carvalho faleceu em 13 de maio de 2017, aos 70 anos, em Brasília. Deixou como legado não apenas um conjunto de políticas bem-sucedidas, mas um exemplo de comprometimento humano e ético raro.
É lembrado por lideranças indígenas, colegas e estudiosos como um verdadeiro militante dos direitos indígenas, alguém que arriscou a própria carreira — e a própria vida — em nome da justiça.
Seu nome permanece vivo entre os Kinjas e na história brasileira como símbolo de resistência, dignidade e esperança.